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EM DEFESA DA BONIFICAÇÃO REGIONAL NA UNIFAP. POLÍTICAS AFIRMATIVAS SÃO IMPORTANTES PARA REPARAR O RACISMO, O ELITISMO E O “VIRALATISMO” HISTÓRICO!

Foto do escritor: UTOPIA NEGRA - ENEGRECER A POLÍTICA AMAPAENSEUTOPIA NEGRA - ENEGRECER A POLÍTICA AMAPAENSE

Atualizado: 26 de fev.

Por Luana Darby e Welliton Brasil


O Coletivo Utopia Negra Amapaense manifesta total apoio à Bonificação Regional no processo seletivo da Universidade Federal do Amapá - Unifap e às políticas de ações afirmativas nas universidades públicas.


A política afirmativa da bonificação teve como origem corrigir as disparidades sociais. Trata-se de um meio muito importante para o povo preto, ribeirinho, indígena e comunidades rurais do Amapá e regiões do Pará, principalmente em cursos de graduação onde há disputa muito grande de pessoas que vem do Sul e Sudeste - cursos como medicina, direito, farmácia, ciências da computação, psicologia, entre outros. Infelizmente, não é a primeira contestação sobre ações afirmativas que garantam reparações ao povo negro e a busca por igualdade e equidade racial e social. 


Desde 2019, quando a Resolução n. 035/2019 foi aprovada pelo Conselho Superior Universitário - CONSU/UNIFAP, a política afirmativa foi alvo de críticas, principalmente por empresários donos de cursos pré-vestibulares, donos de escolas privadas (pois, inicialmente, a proposta da resolução contemplava somente estudantes de escola pública) e servidores públicos e privados que compõem a pequena elite amapaense. Isso mostra que, além de não estarem satisfeitos com a proteção dos direitos humanos de pessoas historicamente afetadas pelo Estado brasileiro, esse seleto grupo legitima a perpetuação das disparidades regionais, sociais, econômicas e raciais, revelando seu caráter anti autonomia do estado amapaense e anti desenvolvimento regional, sustentado em um “viralatismo” que impede as identidades amazônicas de se manifestarem na própria região. 


A bonificação regional, segundo o Relatório de Gestão da Unifap do ano de 2022 

“foi estabelecida por meio da resolução nº 35/2019, tendo como base a decisão do CONSU, os questionamento do Ministério Público Federal, e os pareceres das câmaras de Ensino, Extensão, Interiorização e Assuntos Comunitários (CEEIAC) e da Câmara Legislação e Normas (CLN)” (UNIFAP, 2022) (1). Portanto, é baseada em leis e regimentos que garantem sua segurança e autonomia. 


O ataque ocorreu antes sobre a política de cotas raciais em 2012, conquistadas pelos movimentos sociais, em especial o movimento negro. Em 2023.1, a UNIFAP apresentava cerca de 175 cotistas no Campus Marco Zero. Os cursos que contavam com mais vagas preenchidas por esta política foram: Enfermagem(9), História (9), Farmácia (8), Fisioterapia (8), Administração (8), Medicina (7), Direito (7), Letras Libras-Português (6), Pedagogia (6), Educação Física (6), Geografia (6). (UNIFAP, 2023, p. 65) (2)


A bonificação regional destina que 20% seja acrescido às notas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) obtidas por estudantes da rede pública e privada de ensino do Amapá e mesorregião do Pará (Almerim e Marajó); ação afirmativa, que junto com as cotas, tem a intenção de corrigir injustiças sociais e raciais e a desigualdade regional.


Em números absolutos, a bonificação beneficiou muitos residentes do Amapá e Pará: em 2022, foram 2.292 pedidos deferidos e 856 não deferidos. Já dos aprovados, consta que 590 usaram a política e 84, não. Em 2023, 3.148 solicitaram a bonificação, e 1.130 tiveram o direito concedido. Dos aprovados, 590 foram impactados com essa reserva especial de vagas. Ambos dados podem ser encontrados nos Relatórios de Gestão de 2022 e 2023 da UNIFAP. (3) (4)


A  judicialização de processos seletivos na UNIFAP indigna e preocupa, quando se trata da busca por igualdade e equidade racial e social na educação e sociedade amapaense, e mais quando os índices mostram que a política está cumprindo seu papel social. 


Em uma interpretação estranha aos próprios objetivos constitucionais de diminuição das desigualdades regionais, o Ministério Público Federal,  baseou-se na decisão também longe da realidade material da Região Norte - que, segundo o Ideb 2023, atingiu 5,0 no índice em desenvolvimento no ensino fundamental I, 4,3 no ensino fundamental II e 3,8 no ensino médio, índices aquém da média nacional, que são de 6,0,  5,0 e 4,3, respectivamente (G1, 2024). (5)  A ação contraditória agora ganha amplitude no Supremo Tribunal Federal que considerou inconstitucional a bonificação regional. (6)


Nesse ponto, pontuamos e propomos ao MPF e Judiciário brasileiro a interpretação da Constituição de 1988 na perspectiva de um constitucionalismo que considere a histórica desigualdade racial e social no Brasil. Nessa linha cabe  destacar a iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com a Resolução n. 598 de 22 de dezembro de 2024 (7)  que estabelece as diretrizes para adoção de Perspectiva Racial nos julgamentos em todo 

o Poder Judiciário. Já está mais do que na hora do Ministério Público e Poder Judiciário, doutrina jurídica nacional e “operadores” do Direito considerarem a interpretação constitucional com o olhar do Direito das Relações Raciais e Direito Antidiscriminatório (8), para a efetivação de direitos fundamentais e humanos da população negra e da classe trabalhadora brasileira.


Enfrentar as desigualdades históricas, presentes na sociedade brasileira racista, burguesa e extremamente desigual, não pode ser uma tarefa apenas da Educação superior e movimentos sociais. O Estado brasileiro deve promover políticas públicas para se alcançar condições básicas de desenvolvimento humano e garantia dos direitos humanos. Por isso, parlamentares devem trabalhar de fato e propor a modificação da Constituição para deixar escuro a constitucionalidade da bonificação regional no Amapá.


A realidade  atual do Amapá exige políticas afirmativas para que pessoas negras, quilombolas, indígenas, ribeirinhas, pobres, pessoas trans, LGBTQIAPN+ e amazônidas possam acessar, permanecer e sair da universidade em condições iguais ao restante da população brasileira de outras regiões com melhores índices educacionais. Já não bastam as desigualdades sociais e econômicas locais. 


Por exemplo: se não há mais programas de residência médica,  a responsabilidade é dos governos para investir e desenvolver a saúde pública no Amapá. Governos devem promover políticas públicas em conjunto para combater as desigualdades e iniquidades sociais.


Defendemos totalmente as cotas raciais, políticas de ações afirmativas e a bonificação regional nas universidades públicas do Amapá! A luta contra o racismo, o elitismo e a anti autonomia do Estado, da classe trabalhadora se constrói na defesa de políticas públicas e na luta coletiva nas ruas e nos espaços de poder. 

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Luana Darby Nayrra da Silva Barbosa: Socióloga, Mestre em Ciências Sociais - UNESP/FCLar, Integrante do Laboratório de Política e Governo da Unesp (LAbPol/Unesp), Integrante do programa Jovens Pesquisadores Amazônidas para a Realidade Climática (JOPA/COJOVEM), Coordenadora de Educação no Coletivo Utopia Negra Amapaense

Welliton Brasil:  Advogado, Servidor Público Federal, Mestrando em Políticas Públicas e Gestão da Educação Superior (POLEDUC/UFC), Coordenador Jurídico do Coletivo Utopia Negra Amapaense.

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Referências: 

2 -  Quantidade de Alunos Cotistas Matriculados no Semestre 2023.1 na Graduação. https://dados.gov.br/dados/conjuntos-dados/quantidade-de-alunoscotistas-matriculados-no-semestre-20231-na-graduacao 

3 - Disponível em: Idem (1)

4 - Resolução 01/2024/CONDIR-UNIFAP, Relatório de Gestão de 2024. Disponível em: https://www2.unifap.br/deplan/files/2024/12/Res._1.2024_-_CONDIR_-_Aprova_o_Relatrio_de_Gesto_2023_-_RESApndice-1.pdf

5 - Amapá não alcança média nacional do Ideb e tem a nota do ensino fundamental mais baixa do país.Disponível em: https://g1.globo.com/google/amp/ap/amapa/noticia/2024/08/14/amapa-nao-alcanca-media-nacional-do-ideb-e-tem-a-nota-do-ensino-fundamental-mais-baixa-do-pais.ghtml

7- Resolução 598/2024, CNJ. Estabelece as diretrizes para adoção de Perspectiva Racial nos julgamentos em todo o Poder Judiciário. Disponível em:https://atos.cnj.jus.br/files/original121813202411266745bc8528359.pdf

8 - Moreira, A. J. (2024). DIREITO DAS RELAÇÕES RACIAIS: UMA LEITURA DAS FORMAS DE GOVERNANÇA RACIAL NA HISTÓRIA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA. REI - REVISTA ESTUDOS INSTITUCIONAIS, 10(4), 1115–1141. Disponível em: https://doi.org/10.21783/rei.v10i4.873


 
 
 

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