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  • Foto do escritorUTOPIA NEGRA - ENEGRECER A POLÍTICA AMAPAENSE

Amazônia entre o local e global: um olhar de um amazônida no combate à necropolítica

Por Josué Martins



Reprodução: Greenpeace


Em cada época histórica, os modos de viver dominantes (trabalho, consumo, lazer, convivência) e de antecipar ou até mesmo adiar a morte são relativamente rígidos. No entanto, esses "modos de viver" característicos da sociedade ocidental, norteada pela visão conservadora do hipercapitalismo, caem por terra ao serem confrontados. Ora pelos modos de viver e de vivência das sociedades tradicionais (quilombolas, indígenas, ribeirinhos) e de grupos que também são marginalizados, por conta do racismo, da violência de gênero e da violência de classe, e principalmente a violência estatal. Ora por situações de mudanças bruscas, como é o caso da pandemia da Covid-19, que ainda atinge a humanidade.


Esse confronto entre as vivências é próprio de nossa sociedade e torna-se mais latente quando a humanidade tem que desacelerar a lógica da exploração e produção em larga escala, com foco no lucro próprio da sociedade ocidental capitalista. Sim, a sociedade não parou. Mas teve seu abrandamento com o avanço da morte desenfreada pela Covid, um exemplo foi quando um especialista na qualidade do ar, da agência espacial dos EUA (NASA) afirmou que nunca tinha visto uma quebra tão dramática na poluição numa área tão vasta do país. Em se tratando do maior centro de atividade econômica do mundo.

A comparação com nosso modo de viver e a extinção de nossa espécie parece algo amedrontador. A catástrofe ecológica em curso por esse modo de viver estaria desacelerando conforme nosso desaparecimento. Seria uma estranha comunhão de destinos. Aqui trazemos uma questão do epistemólogo Boaventura de Sousa: "Teremos perdido a imaginação preventiva e a capacidade política para a pôr em prática ?". Daí voltamos para o modo de viver aqueles bem mais básicos que o mundo do capital nos obrigou a assimilar.


Refletindo sobre essas vivências e convivências, tendo como referência o lugar onde moramos e colocamos eles em práticas sociais, a Amazônia um conglomerado de potências, a floresta e o Rio Amazonas que nos rasga ao meio e principalmente as vidas que por aqui insistem em existir e resistir.


Esta semana vários "parentes" - maneira carinhosa em que os povos originários se tratam - indígenas vários povos do Brasil inteiro, deram início a maior mobilização resistência e ocupação já vista no país desde 1988 - Época que se promulgou a "constituição cidadã" que supostamente, seria o marco da 'redemocratização' e fim dos autoritarismos militares no país. Enfrentando uma pandemia mortal, o agronegócio e a mineração, mais de 6000 mil indígenas de 173 povos foram para Brasília - Bloco da Necropolítica e do governo genocida de Bolsonaro e Mourão. Para lutar pela vida, contra o "marco temporal" pela demarcação de suas terras


Josué Martins - Foto: Rayane Penha


O projeto de lei PL 490 que irá ser julgado pelo supremo determina que as TI 's -Terras Indígenas - em processo de demarcação, ou que sejam demarcadas futuramente, se restrinjam àquelas que estavam ocupadas pelos povos originários em 5 de outubro de 1988. Esse é o “marco temporal” que inviabiliza o reconhecimento dos territórios que já existem muito antes de 1988. O projeto ainda abrange pontos como a abertura das TIs ao agronegócio, às atividades de mineração e à construção de hidrelétricas, entre outras obras. O PL 490 já havia sido rejeitado em 2009 na Comissão de Direitos Humanos, mas voltou à pauta após parecer favorável do relator Arthur Maia (DEM-BA), integrante da bancada ruralista da Câmara. O julgamento seria ontem, quarta feira dia 25, mas incrivelmente pela quarta vez em dois meses foi adiado. E deve ser julgado e votado hoje dia 26 pelo STF. Entidades, personalidades da sociedade civil, artistas nacionais e internacionais, estão apoiando a causa indígena para evitar o avanço da catástrofe ecológica. Ontem estiveram presente inclusive, DJ Alok e o vocalista da banda francesa Gojira Dunplantie, que em março deste ano, lançou um single "Amazônia"revertendo arrecadação de fundos para a articulação dos povos indígenas do Brasil (APIB).

Os "parentes" esperam que nesta quinta feira, os votos do STF reafirmem os direitos constitucionais indígenas e afastem qualquer possibilidade de restrição ou reversão do que foi garantido pela Constituição Federal de 1988 , eles seguem com seus modos de viver e resistir. Esses povos seguem mobilizados marchando, cantando, dançando, e sacudindo o chão de Brasília contra o marco temporal e contra a guerra declarada há cinco séculos pelo estado, contra os povos originários


A luta pela vida e pela floresta de pé é a pauta mor dessa movimentação em Brasília.


Visto que o desgoverno que se instalou através de um golpe parlamentar em 2016 tem atentado contra a vida e o bem-estar social do povo brasileiro. Ao nomear seu ministro do meio ambiente Ricardo Salles implantou sua Necropolítica de ódio e racismo contra as populações tradicionais e o meio ambiente. Em uma fala no dia 22 de abril de 2020, em reunião ministerial, Salles afirma para que o governo aproveite, enquanto a atenção da sociedade e da mídia estavam voltadas para o novo coronavírus, flexibilizar as medidas de proteção ao meio ambiente e "passar a boiada", expressão que denota ao desmatamento e avanço do agronegócio, típicos da bancada ruralista.

Em se tratando de meio ambiente e toda sua riqueza faunística, floral e humana existem duas maneiras que envolvem os 'meios de viver' e conviver com ele, uma maneira cujo os interesses são de explorar de maneira predatória, com foco na obtenção imediata do lucro, extintiva e feroz, que coloca em risco a nossa própria sobrevivência no planeta. E outra completamente divergente, aquela que põem em prática a "imaginação preventiva" ancorada pela política de preservação da vida e da floresta, usando os recursos de maneira responsável e não auto predatória.


Num exemplo de como estamos deixando que nossos modos de viver nos sabotem temos os dados do instituto Amazon que afirma que em junho de 2021 o desmatamento na Amazônia legal somou novecentos e vinte e seis quilômetros quadrados, um aumento de 10% comparado a junho de 2020, quando o desmatamento somou oitocentos e quarenta e dois quilômetros quadrados.


A maneira como cuidamos das coisas e das pessoas é diferente aqui na Amazônia, não somos nós que destruímos nossas florestas, para criação de rebanhos. Nós não plantamos soja em larga escala, nós não temos mineradora, nós não temos nem o direito de usar a energia produzida com a inundação da floresta. Aqui no Amapá nós sofremos um apagão no meio da pandemia mesmo tendo quatro hidrelétricas que atualmente utilizam a força do Rio Araguari e do Rio Jari, braços do leito amazônico. E apesar disso, o Amapá continua apresentando uma das tarifas de energia elétrica mais caras do Brasil. Nós amazônidas somos explorados e vilipendiados para que outras regiões do país tenham privilégios. Repito, não somos nós que destruímos a natureza e matamos nosso povo. O governo com os grandes projetos de obtenção de lucro, empreiteiras e agronegócio já fazem isso há anos. Desde a década de 40 quando foi detectado as jazidas de ferro de alto teor no Amapá. O Manganês foi a desculpa mas levaram tudo, inclusive a nossa dignidade, a vontade de viver de muitos.

Todo dia morre um jovem negro na periferia. Morte fruto da Necropolítica de um governo militarizado e policialesco; sim o mesmo que foi preso em 2010 na operação "Mãos limpas" que foi deflagrada no dia 10 de setembro de 2010, às vésperas das eleições estaduais e resultou na prisão, determinada pelo Superior Tribunal de Justiça, de vários políticos, agentes públicos e empresários e na apreensão de mais de R$ 1 milhão em dinheiro, carros luxuosos (entre eles um Maserati e uma Ferrari), imóveis e até um jato executivo Cessna, propriedade do, então, presidente do Tribunal de Contas Estadual TCE, Júlio de Miranda Coelho. Durante as buscas e apreensões, foram mobilizados 600 policiais federais, que cumpriram mandados no Amapá, no Pará, na Paraíba e no estado de São Paulo. Além disso, participaram da ação cerca de 60 servidores da Receita Federal e 30 da Controladoria-Geral da União AGU. As investigações apontaram para desvios de verbas estaduais e federais no Governo do Estado, na Prefeitura de Macapá, na Assembleia Legislativa, no Tribunal de Contas do Estado do Amapá e nas Secretarias de Estado da Saúde, de Inclusão e Mobilização Social, de Desporto e Lazer e de Justiça e Segurança Pública. 18 participantes da quadrilha que fraudava licitações, praticavam corrupção ativa e passiva, superfaturamento em obras e serviços foram presos. Dois deles na sede da PF em Brasília e os outros 16 incluído o atual governador Waldez Góes foram para o presídio da Papuda no Distrito Federal.


Ainda sobre as condenações do suposto gestor, estão a decisão Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) dia 06 de novembro de 2019, que condenou o governador do Amapá, Waldez Góes (PDT), por reter na folha de pagamento dos servidores públicos valores de empréstimos consignados, sem repassá-los às instituições financeiras conveniadas, utilizando-os para saldar outras dívidas públicas. O STJ condenou Waldez a 6 anos e 9 meses de reclusão em regime semiaberto pelo crime de peculato, além de multa de R $6,3 milhões. Curiosamente o ministro da suprema corte Superior Tribunal Federal – STF, Dias Tofolli, fez uma visita ao Amapá em 17 de abril do mesmo ano, "supostamente" visitando os tribunais estaduais. No dia 07 de janeiro de 2020, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, suspendeu o andamento da ação penal que condenou à prisão e à perda do mandato do governador do Amapá Waldez Góes. Na decisão liminar, o ministro Toffoli considerou que o STJ não tem competência para julgar o caso. Talvez a gente imagine qual o real motivo da visita.


Essa semana a banda britânica de rock alternativo Coldplay citou alguns dos governadores da Amazônia, para fazerem história no combate às mudanças climáticas. 'Vocês vão se juntar a nós no #GlobalCitizenLive com compromissos de conservação e adaptação?", diz o post.

Em resposta, Waldez publicou: "Para sobreviver, o mundo merece mais do que a humanidade oferece neste momento da história. Somente com um forte vínculo desenvolvido a partir da unificação global, seremos capazes de efetivamente iniciar uma nova era de restauração do planeta. A região amazônica está cumprindo seu dever. Conte conosco".


Um governo que não respeita nem o seu povo. Exemplo disso é que semana passada pacientes com câncer estavam protestando por água para beber, leitos para cirurgia e medicamentos, um governo que administra a polícia que mais mata no Brasil. Que administra o estado que exportou só com agronegócio, segundo a secretária de comércio e relações internacionais do ministério da agricultura pecuária e abastecimento, as cifras de 12,11 bilhões de dólares este ano, um acréscimo de 25% em relação às exportações ao ano de 2020, e a gente nem falou do extrativismo vegetal, setor que o segundo produto mais exportado pelo estado - madeira.


Só em 2019 foram duzentos e sessenta e um milhões em produtos os portos movimentaram 1.635.584 toneladas de produtos, querem saber qual produto é mais exportado pelo Amapá? Não sabe? É o ouro em minério - não monetário'. Ouro, madeira e soja - só a soja em 2019 correspondeu a 8,73 milhões de dólares - os três primeiros do ranking de exportação. Em 2019 a balança comercial do Amapá demonstrou um superávit, ou seja, o estado exportou mais seus produtos do que importou de outros países isso gerou um montante de 113 milhões de dólares em saldo.


A gente se pergunta onde é investido tanto Money?

Bom pra quem não sabe ouro tá embaixo da terra e é lógico que antes de cavar tem que se desmatar a floresta. E já que estamos falando de floresta alguém já ouviu falar da FLOTA a (floresta estadual do Amapá ) essa que é tema de conversas de vídeos conferências com o vice-presidente Hamilton Mourão. No ano passado, o governo federal lançou um edital de concessão de exploração "madeireira".


O Serviço Florestal Brasileiro lançou em 16 de setembro de 2020 o Edital de Concessão da Floresta Nacional do Amapá, localizada nos municípios de Pracuúba, Ferreira Gomes e Amapá, no estado do Amapá. Esta concorrência pública é composta de um lote de 4 UMFs - Unidades de Manejo Florestal - que totalizam aproximadamente 265 mil hectares. A cessão de entrega dos envelopes, após um adiamento gerado pelos impactos do apagão no Estado do Amapá, foi realizada em 23 de novembro. Foram recebidas propostas de 12 empresas interessadas. A parceria já estava em curso desde janeiro de 2019. O Exército Brasileiro (EB) já começou o georreferenciamento das terras amapaenses para a regularização fundiária, como parte de um conjunto de medidas adotadas pelo Governo do Estado do Amapá (GEA) para destravar o processo de desenvolvimento social e econômico da região. "O Exército dará o seu melhor, para entregar geoinformação com segurança técnica. Esse será mais um instrumento crucial para que o Estado possa regularizar a parte fundiária do Estado, limites, propriedades, distribuição de glebas, títulos corretos e, assim, oferecer um terreno regular e seguro a quem queira investir”, assegurou o chefe do Departamento de Ciência e Tecnologia do EB, general Bráulio Machado. Aqui a gente pontua que o desmatamento vem sendo orquestrado nas diferentes esferas federal e estadual, pois a concessão permite a exploração por 40 anos da área.


Voltando a as fraudes em licitação, chamo a atenção para uma recomendação do Ministério Público do Amapá através da promotoria do município de Porto Grande - um dos dez municípios, que compõem a FLOTA - na qual : pede que o diretor-presidente do Instituto Federal de florestas do Amapá (IEF), Marcos da Silva Tenório, que afaste da função o presidente da Comissão Especial de Licitação, Sebastião Clessio Alfaia Trindade. Segundo o MP o ato é baseado em Ação Judicial, garantiria o princípio constitucional da isonomia na licitação para concessão da prática exploração de produtos florestais nas Unidades de Manejo Florestal (UMF), localizadas na Floresta Estadual do Amapá (Flota).

Vejam um servidor público, que ocupava o cargo de chefia já tinha sido condenado em 1ª instância, em 2014, pela 4ª Vara da Justiça Federal de Macapá, pela prática de crime de fraude em licitação; e que em 2016, o servidor Sr Sebastião, atuou como representante de empresa em concorrência pública para Concessões Florestais do Instituto de Desenvolvimento Florestal da Biodiversidade do Estado do Pará - um instituto do estado vizinho.

Só lembrando que o Pará, segundo o estudo feito pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) , foi o estado da Amazônia Legal com maior índice de desmatamento no mês de junho deste ano.


O MP AP considerou o fato de o servidor atuar ora como presidente da comissão especial de licitação fiscalizando indeferindo e referendando quem ganhará a licitação para exploração, e também como representante da empresa cujo maior interesse é ganhar a concessão para exploração da área da FLOTA além do conflito de interesses, configura- se fato de extrema improbidade administrativa. Ainda para o MP AP feriria aos princípios constitucionais da isonomia e moralidade pública


Com essas informações a gente sabe que pelo governo atual no Amapá, não há como se fazer história no combate às mudanças climáticas. Nem vai se juntar a vocês Coldplay no #GlobalCitizenLive.


Pelos modos de viver a gente sabe quem é responsável pela vida e manutenção dela, que a gente consiga ficar do lado de quem realmente protege a floresta a vida e a dignidade do nosso povo Amapaense.


Grande abraço ao Coldplay! Que vocês consigam mobilizar mais pessoas pelas mudanças climáticas, porque aqui nós seguimos resistindo com nossos modos ancestrais. Aqui é nós por nós.




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